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Likes? Pegadinhas de pais em redes sociais impactam saúde dos filhos

Recentemente, o desafio #eggcrackchallenge viralizou nas redes sociais e chamou atenção de mães, pais, responsáveis e especialistas. Nele, os tutores filmavam a reação de suas crianças ao quebrarem ovos em suas cabeças.

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Enquanto as crianças se mostram assustadas, tristes e surpresas, os adultos riem da situação. Eventualmente, tendências como essa vêm surgindo com maior frequência nas redes sociais. A busca incessante por curtidas e visibilidade por meio dessas ‘brincadeiras’, no entanto, gera controvérsias e coloca em risco a saúde mental das crianças.

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A mestre em psicossomática e psicologia hospitalar pela PUC-SP e pós-graduanda em Neuropsicologia pelo Hospital Israelita Albert Einstein, Irit Grau Kaufmann – credenciada à Rede Plus, da Care Plus – explica que ao se deparar com esse tipo de situação, as crianças demonstram sentimentos de raiva, tristeza ou indignação, em decorrência da quebra de confiança e falta do afeto positivo.

“Essa quebra da confiança pode afetar sim, e muito, pois prejudica uma base psicológica essencial a qual chamamos de comportamento de apego seguro, que ocorre quando a criança vem desenvolvendo a relação afetiva e o vínculo afetivo com os pais”, descreve.

“Quando um fato como esse [a exemplo das pegadinhas] acontece, essa base pode ser quebrada ou criar um mal-estar, insegurança ou confusão, fazendo com que ela questione: ‘quem me ama e dá afeto está me machucando e/ou rindo de mim à toa’”, esclarece Irit.

De acordo com a especialista, a quebra de confiança pode contribuir para o surgimento ou agravamento de questões relacionadas à saúde mental das crianças e adolescentes.

“Dependendo do sentido e significado que a criança atribuir a esses eventos, ela pode se sentir traumatizada, contribuindo para o aumento da insegurança e medos que antes não existiam”, pontua a psicóloga.

Ela explica, ainda, que a capacidade de leitura das crianças sobre determinadas ações começa a se formar a partir dos quatro anos de idade, conforme o seu próprio desenvolvimento.

A partir desta idade, a criança consegue ter uma leitura corporal dos cuidadores, e a partir dos seis anos, ocorre o desenvolvimento das funções executivas do cérebro, importante para a resolução de problemas. “Até então, a criança não tem essa capacidade, apenas comportamentos de reação a uma situação, puramente emocional”, esclarece Kaufmann.

Por isso, as pessoas responsáveis pelas crianças devem ficar atentas às ações que exigem maiores noções sobre consentimento, senso de humor e desenvolvimento cognitivo infantil. Dessa forma, é importante que tudo seja muito bem explicado para as crianças, de acordo com sua capacidade de entendimento e idade.

“Por mais que elas não entendam exatamente cada coisa, é essencial que os responsáveis verbalizem tudo para as crianças desde sempre”, reforça a psicóloga.

Mais do que isso, pegadinhas, a exemplo do #eggcrackghallenge, podem indicar um comportamento narcisista dos adultos e a necessidade de reflexão em torno de suas próprias ações.

“Os pais e responsáveis devem pensar em não fazer aos filhos o que não gostariam que fizessem consigo, exercendo a empatia e o diálogo, para que saibam o que é consentimento e, principalmente, para que percebam quem são suas crianças”, alerta Kaufmann.

Como (re)construir laços

O ideal é evitar tais brincadeiras e agir para não as repetir, procurando conversar sobre o fato, com ternura e desculpando-se com a criança quando necessário. Além da influência de tendências desses comportamentos nas redes sociais, a especialista alerta para questões importantes e profundas que devem ser trabalhadas em psicoterapia.

“Nesses casos, uma avaliação psicológica seria uma boa alternativa.” Irit esclarece ainda que reconquistar a confiança da criança e estabelecer uma relação saudável entre as pessoas da família é uma construção conjunta.

“Isso vem por meio de um fazer junto, sem ironias, sem bullying, ou seja, em parceria”, reflete. “Pais e filhos que têm um diálogo aberto em casa são pais que poderão enxergar, escutar de verdade e, portanto, ajudar seus filhos para que não sofram bullying e que, também, não façam bullying a outros colegas”.

Ela comenta, ainda, que crianças que passam por bullying muitas vezes não relatam essas ações aos responsáveis por vergonha ou medo e, por isso, a atenção do adulto é essencial para uma intervenção assertiva.

“Aqueles cuidadores que conhecem seus filhos pelo olhar, tom de voz e postura corporal entenderão que algo pode estar acontecendo com eles”, ressalta.

O uso das tecnologias e plataformas digitais para entretenimento também deve levar em consideração alguns cuidados, como prestar atenção a vídeos, programas ou jogos que as crianças tenham acesso, para que se saiba quais conteúdos e linguagens estão apropriados para cada idade. Irit alerta, por fim, sobre a exposição de crianças em redes sociais.

“Não é recomendada a exposição das crianças a veículos de mídia sociais. Caso isso ocorra, que seja de uma maneira que não afete as habilidades socioemocionais das crianças, dando a elas a possibilidade de aprendizados, a capacidade da empatia, o entendimento sobre como o outro se sente em determinadas situações, e a noção de como reagir da melhor forma em determinadas situações”, destaca a psicóloga.