Segurança

É verdade que o celular escuta conversas para mostrar anúncios?

É bem possível que alguma vez você tenha tido a sensação de que o celular pode ouvir o que se fala. Afinal, já deve ter acontecido de receber a indicação de um produto ou serviço relacionado a algo que tenha comentado com familiares ou amigos ao falar ao telefone – ou até mesmo em conversas ao vivo.

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Por esse motivo, muitos dos que afirmam estarem sendo gravados pelos smartphones acham que os celulares estão constantemente nos ouvindo. Com isso, as plataformas categorizam as pessoas e usam esse conhecimento para direcionar anúncios.

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Será que é isso mesmo que acontece?

De acordo com Yasodara Cordova, pesquisadora-chefe em privacidade, e Caio Gomes, diretor de dados, ambos da empresa especializada em identidade digital Unico, a reposta é não. Os celulares não “grampeiam” as pessoas.

Diferentemente das teorias de conspiração, a realidade é que as empresas não gravam conversas – ou escutam o que se fala o tempo todo. Na verdade, é tudo uma questão de estatística e muita coleta de dados – mas não áudio de conversas.

Estes dados não são coletados sem a permissão dos usuários. É exatamente o oposto: as próprias pessoas dão permissão – ao clicar e aceitar os termos de consentimento e políticas de privacidade – para que aplicativos e outros serviços conectados coletem seus dados.

Entre as informações que plataformas têm acesso, pode-se citar localização e lista de contatos. Muitos desses dados são necessários para a prestação de serviços via internet.

Primeiramente, é crucial esclarecer que coletar todos os áudios de um celular não é economicamente viável. Se o processamento fosse centralizado na nuvem, o consumo de dados móveis seria tão elevado que o usuário notaria.

Alternativamente, se o processamento ocorresse no próprio aparelho, a bateria se esgotaria rapidamente, algo que também seria facilmente percebido pelo aquecimento do dispositivo.

“Então, como as empresas coletam dados? Elas se concentram em metadados e padrões de comportamento. Imagine que você visite a casa de um amigo e conversem sobre uma marca de celular. A localização já indica que você esteve lá, e se seu amigo pesquisar sobre a marca posteriormente, é um sinal de que você também é um alvo para essa publicidade”, explica Gomes.

Através da análise dessas correlações, as empresas de tecnologia montam cenários publicitários que impactam diariamente. No entanto, é vital reconhecer o papel do viés de confirmação na percepção dessas práticas.

Usuários são bombardeados com centenas, senão milhares, de anúncios todos os dias, a maioria dos quais são ignorados. Mas quando um anúncio se alinha com uma conversa recente, ele chama atenção, criando a ilusão de que a segmentação é mais precisa do que realmente é.

Tende-se a ignorar as inúmeras vezes em que a publicidade falha. As pessoas focam apenas nos acertos, o que pode distorcer a compreensão da realidade.

Levando isso tudo em conta, pode-se ficar tranquilo sobre a possibilidade de gravação de áudio e escuta que porventura celulares executariam. Não só é mais eficiente fazer o direcionamento de anúncios usando dados do seu dia-a-dia, mas possivelmente mais preciso e igualmente lucrativo.

É claro que toda essa paranóia pode ter algum fundamento. As pessoas desconfiam sobre quais dados estão sendo coletados e para quê.

Como já diagnosticado por vários institutos de pesquisa e reconhecido pelo World Economic Forum, é preciso restabelecer as relações de confiança entre pessoas e instituições, incluindo empresas. Para recuperar essa confiança, é importante dar transparência sobre os dados pessoais, uma propriedade da privacidade (que é um direito humano reconhecido na constituição do Brasil).

Afinal, se as pessoas tivessem facilidade para descobrir quais dados estão sendo utilizados e para quê, a relação entre pessoas usuárias e empresas seria muito mais saudável.

É uma forma de o anunciante avaliar a popularidade dos produtos e as variações conforme a idade, gênero, trabalho e hobbies.

“Assistentes virtuais como Siri, Google Assistente ou Alexa estão instalados praticamente em todos os aparelhos e podem peneirar dados de seus usuários para a publicidade digital, uma técnica chamada Retargeting. Isso acontece através dos cookies de internet. Esses cookies são pequenos dados que os sites pedem para guardar durante sua navegação, eles também estão em todos os lugares até mesmo nos nossos celulares. No entanto, os sites sempre pedem permissão para usar esses cookies oferecendo uma experiência mais personalizada”, explica a pesquisadora.

Lei Geral de Proteção de Dados

Falhas de segurança nas plataformas também podem resultar em conteúdos coletados sem autorização e um ambiente favorável para cibercriminosos. Quando o assunto são dados pessoais, as empresas precisam sempre oferecer informações claras e acessíveis.

No Brasil, com a aprovação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), o uso dessas informações foi regulamentado. O tratamento de dados passou por mudanças sendo necessária a autorização do usuário e transparência por parte das organizações sobre o uso desses dados, cabendo sanções em caso de utilização indevida.

“O usuário preocupado com a sua privacidade deve estar atento aos termos e políticas de uso. Se o usuário estiver de acordo com a captura e utilização de seus dados, não há motivos para se preocupar. Provavelmente isso significa que existe uma relação de confiança entre a empresa e a pessoa usuária. Contudo, não é uma situação comum”, comenta Yasodara.

“Hoje em dia ainda existe uma aura misteriosa sobre como a coleta de dados para o fornecimento de serviços é feita, por qual motivo e até quando. A transparência e a segurança são cruciais para todos os envolvidos. Nós da indústria temos a obrigação de melhorar nossos serviços de privacidade”, completa a especialista.

Como posso evitar?

Muitos aplicativos e sites precisam de determinadas informações para manter os serviços, como o WhatsApp ou Instagram, que requerem acesso às câmeras e microfones para desempenhar algumas funções. Entretanto, não são todas as plataformas que precisam disso. Na dúvida, autorize o acesso apenas aos dados necessários.

“Realizar uma compra, fazer um cadastro em um site, curtir ou comentar uma foto nas redes sociais, até dirigir o carro utilizando o GPS, todas essas ações e outras mais são informações que estamos provendo para que os serviços sejam prestados. É importante revisar as permissões dos aplicativos instalados regularmente. Devemos estar atentos a nossa privacidade ao usar, por exemplo, aplicativos desenvolvidos por empresas desconhecidas ou com termos de uso duvidosos”, esclarece a pesquisadora.

É sempre bom lembrar que as dicas de segurança básica devem ser sempre seguidas, como:

  • não dividir a sua conta,
  • não utilizar senhas padrão ou senhas muito fáceis,
  • e até mesmo utilizar VPN quando necessário.

Outro ponto é recorrer a especialistas sempre que existirem dúvidas, pois a internet está recheada de teorias da conspiração. Na dúvida, vale ler os termos de uso e perguntar, diretamente para o provedor dos serviços, quais dados pessoais estão sendo utilizados, porque, até quando e como. É um direito básico que você deve utilizar sempre que precisar.